Amazon consegue liminar contra Anatel para vender ‘celular pirata’

Após ofensiva da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) para dificultar a venda dos chamados “celulares piratas”, Amazon e Mercado Livre levaram o caso à Justiça na quinta-feira (4), a fim de manter a comercialização desses aparelhos. Estão em jogo multas que podem ultrapassar os R$ 50 milhões.

A Anatel publicou no último dia 21 despacho decisório para coibir a venda dos aparelhos ilegais —tratam-se de dispositivos sem procedência confirmada ou contrabandeados—, com um cronograma de multas diárias e progressivas em 25 dias, de R$ 200 mil a R$ 6 milhões. As empresas teriam 15 dias corridos, até este sábado (6), para se adequar.

A medida cautelar da agência setorial menciona Amazon, Americanas, Carrefour, Ebazar.com.br, Casas Bahia, Magazine Luiza e Shopee.

A Amazon acionou o Tribunal de Justiça de São Paulo e conseguiu suspender liminarmente o efeito da decisão da Anatel, que irá recorrer.

“A Anatel deverá abster-se de aplicar multa, impor obrigação de retirada de anúncios ou bloqueio do domínio da impetrante em razão do não cumprimento das obrigações previstas no ato impugnado”, afirma o juiz Ricardo de Castro Nascimento nos autos.

No mandado de segurança, a Amazon argumenta que atuação da Anatel está limitada aos prestadores de serviço de telecomunicação e, por isso, a atividade de ecommerces estaria fora da alçada da agência reguladora.

“Adotaremos as medidas necessárias para fazer valer nossas determinações contra a comercialização de celulares não homologados em marketplaces”, diz a Anatel em nota.

O Mercado Livre procurou a 1ª Vara Federal Cível do Distrito Federal, com argumentos similares aos da Amazon, e teve seu pedido de liminar negado.

“Ao apresentar suas determinações de controle por parte dos ecommerces, a Anatel está ultrapassando a sua competência, além de estabelecer prazos curtos e penalidades progressivas para as plataformas, como multas diárias e ameaça de bloqueios, negligenciando os aspectos técnicos necessários para o controle efetivo do ingresso e da venda desses produtos”, afirma o Mercado Livre em nota.

O ecommerce ainda diz que apresentou à Anatel, no dia 14 de junho, medidas implementadas no markeplace. “Quando um produto irregular é identificado, o anúncio é excluído e o vendedor notificado, podendo até ser banido definitivamente.”

Procurada pela Folha, a Amazon disse que não comenta ações judiciais em andamento.

Chamados nos marketplaces de “celulares globais”, os aparelhos piratas são versões internacionais de smartphones, em geral de fabricantes chinesas como XiaoMi, Oppo e Realme.

O popular XiaoMi Redmi Note 13, por exemplo, é vendido por R$ 1.840 na loja oficial, enquanto a versão global sai em marketplaces por preços pouco acima de R$ 1.000.

A Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) estima que 25% dos celulares comercializados no Brasil são irregulares.

“Sem a certificação da Anatel, os celulares podem apresentar riscos aos consumidores, desde problemas de compatibilidade e desempenho até perigos à segurança, como risco de explosões, superaquecimento e radiação excessiva”, diz a Abinee, que representa os fabricantes sediados no país. Para a entidade, a venda de aparelhos irregulares “afeta negativamente quem segue as normas”.

A Anatel define como aparelho “pirata” qualquer dispositivo que não esteja homologado. Esses smartphones podem ter origem em contrabando, não ter recolhido imposto, não oferecer garantia ou não ter procedência confirmada.

Celulares só podem ser vendidos no país com autorização da agência, sob o argumento da “escassez do espectro de radiofrequências” —o recurso pelo qual se dá a transmissão de sinal telefônico.

Caso as multas não surtissem efeito, a Anatel afirmou que recorreria ao bloqueio do domínio da plataforma até a regularização dos anúncios.

A Anatel cita que pode garantir a segurança para consumidores e operadoras telefônicas apenas dos aparelhos homologados por sua equipe técnica.

Em comunicado da Anatel, o presidente da agência, Carlos Baigorri afirmou que o bloqueio das plataformas é “uma iniciativa extrema”, mas importante, já que “sinalizaria que não existe um preço para o contínuo desrespeito à legislação”.

Para se adequarem, os ecommerces teriam de:

* incluir campo obrigatório com o número do código de homologação do telefone celular vendido
* instituir procedimento de validação do código de homologação dos telefones celulares cadastrados em relação aos códigos de homologação da base de dados da Anatel
* impedir a venda de novos telefones celulares cujo código de homologação não esteja correto
* retirar todos os anúncios de telefones celulares que não tenham passado pelo procedimento de validação

Folha de S.Paulo Online – 06/07/2024